Resolução sobre as violações dos direitos humanos e do direito humanitário resultantes de ataques aéreos estrangeiros - CADHP/Res.422(EXT.OS/XXVI)2019
Ago 21, 2019
A Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (a Comissão), reunida na sua 26.ª Sessão Extraordinária, realizada em Banjul, República da Gâmbia, de 16 a 30 de Julho de 2019:
Recordandoo seu mandato de promover e assegurar a protecção dos direitos humanos e dos povos em África ao abrigo da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (Carta Africana) e das disposições dos Artigos 60.º e 61.º da Carta que permitem à Comissão inspirar-se e ponderar outros instrumentos e normas internacionais reconhecidos pelos Estados Partes na interpretação da Carta Africana;
Reafirmandoo direito dos seres humanos ao respeito pela sua vida e integridade da sua pessoa e a proibição da tortura, tratamento cruel, desumano e degradante ao abrigo da Carta Africana;
Reafirmandoainda que os direitos humanos e dos povos protegidos pela Carta Africana devem ser sempre protegidos e, portanto, ninguém pode ser arbitrariamente privado desses direitos, inclusive no contexto de conflitos ou de combate ao terrorismo;
Recordandoa sua Observação Geral n.º 3 sobre o Direito à Vida, que prevê que Estados têm a responsabilidade de prevenir as privações arbitrárias da vida causadas pelos seus próprios agentes ou outros para investigar quaisquer assassinatos que ocorram e de responsabilizar os perpetradores";
Recordando igualmenteos seus Princípios e Directrizes sobre os Direitos Humanos e dos Povos no Combate ao Terrorismo em África, que prevêem que os Estados Partes têm a obrigação, ao abrigo do direito internacional em matéria de direito humanitário, de direitos humanos e dos refugiados, não só de proteger as pessoas contra actos de terrorismo, mas também de proteger os suspeitos de terrorismo, as suas famílias e associados contra ataques;
Salientandoque o uso da força deve constituir um último recurso e que os princípios do direito humanitário internacional exigem uma distinção entre alvos civis e militares, a aplicação dos princípios da necessidade e proporcionalidade do uso da força e o tratamento humano das pessoas protegidas;
Profundamente preocupadocom o aumento do uso de aeronaves armadas não tripuladas (“drones”), operados por estrangeiros em resposta à instabilidade em partes de África, incluindo o destacamento de drones armados e de reconhecimento na Somália e na região do Sahel;
Particularmente preocupadocom o facto de os Estados Partes na Carta Africana permitirem que Estados não africanos utilizem aeronaves tripuladas e drones armados em nome do combate ao terrorismo; e
Consternadacom informações recentes segundo as quais esses ataques aéreos de drones por operações militares estrangeiras na Somália aumentaram drasticamente desde 2017 resultaram na morte de civis e no aumento dos riscos de mais vítimas civis;
A Comissão:
-
Recordaaos Estados Partes na Carta Africana que são os principais responsáveis pela protecção de toda a população civil, incluindo através da garantia de que as suas próprias forças e as intervenções militares estrangeiras se abstenham de visar os não combatentes;
-
Reiteraque, no âmbito desta responsabilidade, os Estados Partes na Carta Africana devem criar mecanismos legislativos para regulamentar o uso da força pelos militares estrangeiros, incluindo drones armados, a partir dos seus territórios e efectuar investigações independentes para responsabilizar os autores nos casos em que essa utilização cause danos a civis;
-
Exorta veementementeo Governo da Somália, em colaboração com a União Africana, nomeadamente através da Comissão Africana, a efectuar investigações independentes e transparentes sobre os casos alegados de vítimas civis em ataques aéreos dos Estados Unidos da América e a criar as estruturas necessárias para permitir que as vítimas denunciem tais violações e obtenham reparação;
-
Exortaos governos dos Estados Partes na região do Sahel a assegurarem que a expansão da utilização de forças armadas estrangeiras, em particular de drones armados na luta contra o terrorismo, seja sujeita a uma regulamentação e controlo rigorosos e que sejam tomadas todas as medidas necessárias para evitar vítimas civis resultantes dessa utilização; e
-
Apelaa todos os Estados Partes para que assegurarem que as intervenções militares estrangeiras realizadas com o apoio do Governo se abstenham de violar o direito internacional humanitário, visando civis ou ignorando a perda de vidas ou ferimentos de civis, e que sejam tomadas precauções activas e todas as medidas razoáveis, tal como exigido pelo direito internacional humanitário, para proteger vidas civis.
Feito em Banjul, a 30 de Julho de 2019